sexta-feira, 8 de março de 2019

Resenha - Primavera silenciosa Primavera silenciosa, Rachel Carson - São Paulo, editora Gaia, 328 p.


Primavera silenciosa Primavera silenciosa, Rachel Carson 

A bióloga norte-americana Rachel Carson (1907-1964) escreveu em 1962 , vemos descrito com impressionante clareza o que são os dias de hoje, século 21, em que a destruição do meio ambiente se faz presente a cada passo de nosso caminho.

A primavera continua silenciosa, apesar de a proibição total do uso e da produção do inseticida DDT em nosso país ter sido finalmente adotada em lei federal no ano de 2009. O livro, reeditado no Brasil pela editora Gaia, conta com posfácio do historiador norte-americano Edmund Wilson (1895-1972) que é leitura obrigatória.

Nos Estados Unidos, Primavera silenciosa surgiu para dividir uma bola com o público, bola essa que a ciência da época talvez acreditasse inexistente, porque, atrelada ao capitalismo vigente, acreditava que mais valia produzir do que preservar e, se pestes e pragas trazem prejuízos, deviam ser combatidas com todas as armas existentes.

Totalmente ancorado em fatos, o livro que Carson escreveu traz em detalhes o impacto negativo, no meio ambiente, do uso abusivo dos agrotóxicos organoclorados. O Brasil conheceu o DDT nos anos 1940 como uma maravilha da química e da técnica, uma forma de nos livrarmos dos insetos. A obra traz em seu bojo, também, a semente da ética ambiental, lançando luz sobre um debate que não perde a atualidade.

Carson nos fala com linguagem fácil e precisa sobre o desaparecimento de espécies de aves causado pela acumulação progressiva de resíduos de DDT ao longo das cadeias alimentares (daí o título do livro, referência a uma primavera sem o canto dos pássaros), e descreve a ameaça que pairava sobre as águias, símbolo de seu país. Ela aponta efeitos hormonais dos inseticidas e impactos sobre a reprodução humana, e sugere que o câncer tem co mo uma de suas raízes os venenos agrícolas. A bióloga associa esses danos aos produzidos pelas radiações, o que ampliou ainda mais o impacto de suas declarações, já que o mundo naquela época vivia assombrado pela potencial destruição de uma guerra nuclear. Ela não viveu para ver que seu relato serviu de base para a definição política da criação de novas leis e órgãos ambientais, incluindo a Agência de Proteção Ambiental dos Estados Unidos (EPA), o que levou à proibição do uso do DDT em solo norte-americano.

Como a gana de lucro é muito grande, o mundo permanece, apesar das advertências de Carson, assolado por inúmeros produtos químicos cuja ação tóxica em longo prazo desconhecemos. No entanto, eles estão na ordem do dia, dentro de nossas casas, contaminando nossas lavouras, nossa comida, nossa água. Produtos esses que também estão presentes em nossos computadores, carros e celulares, em que encontramos desde metais pesados até dezenas de compostos poli- -halogenados que, se não trata - dos de modo adequado, fatalmente seguirão para o ambiente natural, contaminando-o.PRIMAVERA SILENCIOSAApesar de ser um livro antigo e versar principalmente sobre os insetiscidas, trata-se de um livro belíssimo e permanece atual na medida que chama atenção para o despejo de muitos produtos químicos que convivemos atualmente. Apesar de, em alguns momentos, achar o livro “muito verde” me inseri no contexto e percebi a dificuldade que a autora teve para chamar atenção a essa problemática. Eis alguns recortes que guardei...:

Pag. 12....A população atribuía aos químicos, trabalhando em seus aventais brancos engomados em remotos laboratórios, uma sabedoria quase divina. Os resultados de seu trabalho eram ornamentados vom a presunção de beneficência. Nos Estados Unidos do pós-guerra, a ciência era Deus, e a ciência era masculina.

Pag. 14/15...Intoxicada com a sensação de seu poder, a [humanidade] parece estar se envolvendo cada vez mais em experiências de destruição de si própria e de seu mundo;

Pag.15 ...Primavera Silenciosa, o produto da sua inquietude, desafiou deliberadamente a sabedoria de um governo que permitia que substâncias tóxicas fossem lançadas no meio ambiente antes de saber as consequências de seu uso a longo prazo. ...A ciência e a tecnologia, denunciava ela, haviam se tornado servas da corrida da indústria química em busca de lucros e do controle dos mercados. Em vez de proteger a população de danos potenciais, o governo não apenas dava sua aprovação a esses novos produtos como o fazia sem estabelecer nenhum mecanismo de prestação de contas. ...”Será que alguém acredita que é possível lançar tal bombardeio de venenos na superfície da terra sem otrná-la imprópria para toda a vida ?”

Pag. 16...”A obrigação de suportar nos dá o direito de saber”

Pag. 19...Este é um livro para saborear: não pelo lado negro da natureza humana, mas pela promessa de possibilidade de vida.

Pag. 152...Como o constante gotejar da água que, pouco a pouco, desgasta a pedra mais dura, esse contato do nascimento até amorte com produtos químicos perigosos, pode, no fim, revelar-se desastroso. Cada uma dessas exposições recorrentes, não importa quão leve seja, contribui para a acumulação progressiva de produtos químicos em nosso corpo e, assim, para o envenenamento cumulativo. Provavelmente ninguém é imune ao contato com essa contaminação crescente, a não ser que viva na situação de maior isolamento imaginável. Anestesiado pelas propagandas sugestivas e pelo persuador oculto, o cidadão comum dificilmente tem consciência dos materiais letais de que está se cercando...

Pag. 152...Se uma grande caveira com dois ossos cruzados embaixo estivesse pendurada na frente da seção de inseticidas, o consumidor poderia pelo menos entrar ali com o respeito normalmente atribuído a materiais legais. 

Pag. 156/7..Na dieta de uma residência comum, as refeições e quaisquer produtos derivados de gordurta animal contém a maior quantidade de resíduos de hidrocarbonetos clorados. Isso acontece porque esses agentes são solúveis em gordura. Os resíduos armazenados nas frutas e nas verduras tendem a apreentar quantidades menores. Essas substãnicas são pouco afetadas pela lavagem – o único remédio é remover e jogar fora todas as folhas externas dessas verduras, como a alface e o repolho, descascar a fruta e não usas as cascas nem nenhuma cobertura exterior. O cozimento não destrói os resíduos.

Pag. 159...Mesmo que 7 ppm de DDT na alface da salada do seu almoço fosse “seguro”, a refeição inclui outros alimentos, cada um com sua quantidade permitida de resíduos, e os pesticidas em sua comida são, como já vimos, apenas uma parte, e, possivelmente, uma parte pequena, da sua exposição total. Esse acúmulo de produtos químicos de várias fontes diferentes cria uma exposição total que não pode ser medida. Não há sentido, portanto, em se falar da “segurança” de qualquer quantidade específica de resíduos.

Pag. 160...Na verdade, então, fixar tolerâncias é autorizar a contaminação dos alimentos consumidos pela população com substâncias químicas venenosas a fim de que o horticultor e a indústria de processamento de alimentos possa desfrutar do benefício de uma produção mais barata – e punir o consumidor exigindo que ele mantenha uma atitulde de vigilância para garantir que não vá receber uma dose letal.

Pag. 163...Devemos nos preocupar mais com os efeitos retardados da absorção de pequenas quantidades de pesticidas que contaminam invisivelmente o mundo...As pessoas se impressionam mais facilmente com as doenças que já tiveram manifestações mais óbvias. No entando, alguns de seus piores inimigos se insinuam da forma mais livre e discreta possível.

Pag. 164...Quando se está preocupado com o misterioso e maravilhoso funcionamento do corpo humano, causa e efeito dificilmente são relações simples e facilmente demonstradas...Estamos acostumados a procurar os efeitos flagrantes e imediatos e a ignorar tudo o mais. A não ser que o efeito apareça de pronto e de forma tão óbvia que não possa ser ignorado, negamos a existência do risco...A falta de métodos suficientemente refinados para detectar os males antes dos sintomas parece ser um dos maiores problemas não resolvidos da medicina.

Pag. 173...O trabalho fundamental de produção de energia é realizado não em qualquer órgão especializado,mas em todas as células do corpo.

Pag. 176...não se deve esquecer que muitos agentes químicos são parceiros das radiações, produzindo exatamente os mesmos efeitos.

Pag. 206...Os agentes químicos se infiltram em nosso mundo de duas formas: em primeiro lugar, ironicamente, na busca do ser humano por uma vida melhor e mais fácil; em segundo, porque a fabricação e a venda de tais produtos se tornou aceita da nossa economia e estilo de vida.

Pag. 207...Para aqueles para quem o câncer já é uma presença oculta ou visível, os esforços para encontrar curas devem, é claro, continuar. Mas para aqueles que não foram ainda atingidos pela doença e, com certeza, para gerações ainda não nascidas, a prevenção é uma necessidade e imperativa.

Pag. 219...Investigações sobre os antecedentes de alguns desses especialistas revelam que todo seu programa de pesquisa foi financiado pelas indústrias químicas. O prestígio profissional desses pesquisadores, e as vezes seu próprio emprego, dependem da perpetuação dos métodos químicos. Podemos então esperar que eles cuspam no prato em que comem ? Todavia, conhecendo essas suas vinculações, que crédito podemos dar a seus protestos de que os inseticidas são inofensivos ?

Pag. 229...o que hoje talvez sejam os inseticidas químicos mais promissores podem ser o lamentável fiasco de amanhã...
Publicado por Rui Alencar03/02/2012

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